2.D - Termos de Troca

Antes de analisar o problema dos termos de troca, é bom recordar a razão da troca — o facto de cada indivíduo valoriza mais o bem que obtém do que o bem de que desiste. Este facto é suficiente para eliminar a noção falaciosa de que, se Crusoe e Jackson trocarem 5.000 bagas por uma vaca, há uma espécie de "igualdade de valor" entre a vaca e as 5.000 bagas. O valor é subjectivo, existe na valorização das mentes dos indivíduos, e estes indivíduos fazem a troca precisamente porque para cada um deles há uma desigualdade de valores entre a vaca e as bagas. Para Crusoe a vaca é valorizada mais do que as 5.000 bagas; para Jackson é menos valorizada. Caso contrário, a troca não viria a ser feita.

 Portanto, para cada troca há uma dupla desigualdade de valores, em vez de uma igualdade, e, portanto, não há "valores iguais" a serem "medidos" de qualquer forma.21

Já vimos quais as condições necessárias para que o intercâmbio se repita e em que medida a troca terá lugar em determinados termos. Coloca-se então a questão: existem princípios que decidam os termos em que são feitas as trocas? Porque é que o Crusoe troca com o Jackson a uma taxa de 5.000 bagas por uma vaca, ou 2.000 bagas por uma vaca?

Vamos fazer a hipotética troca de 5.000 bagas por uma vaca. Estes são os termos, ou a taxa de câmbio (5.000 bagas para uma vaca). Se expressarmos uma mercadoria em termos do outro, obtemos o preço da mercadoria. Assim, o preço de um bem em termos de outro é a quantidade do outro bem dividido pelo valor do primeiro bem em troca. Se duas vacas trocam por 1.000 bagas, então o preço das vacas em termos de bagas ("o preço das bagas das vacas") é de 500 bagas por vaca. Inversamente, o preço das bagas em termos de vacas ("o preço da vaca das bagas") é 1/500 vaca por baga. 

preço e é a taxa de câmbio entre duas mercadorias expressa em termos de uma das mercadorias.

Outros conceitos úteis na análise do intercâmbio são os de "vender" e "comprar". Não existe um contrato de apenas compra ou apenas venda. Há sempre um contrato de compra e venda. Assim, na troca acima, podemos dizer que Crusoe vendeu 1.000 bagas e comprou duas vacas em troca. Por outro lado, Jackson vendeu duas vacas e comprou 1.000 bagas. A venda é do bem de que desistiu na troca, enquanto a compra é a do bem que recebeu. Isto para ambos.

Concentremo-nos novamente no objeto da troca. Recordamos do capítulo 1 que o objetivo de toda a ação é maximizar o ganho psíquico o conforto recebido, e para isso o ator tenta fazer com que a receita psíquica da ação exceda o custo psíquico, para que obtenha um lucro psíquico. Isto não é menos verdade para a troca interpessoal. O objetivo em tal troca para cada parte é maximizar as receitas, trocar desde que a receita psíquica esperada exceda o custo psíquico. A receita psíquica de qualquer troca é o valor dos bens recebidos na troca. Isto é igual à utilidade marginal do comprador de adicionar os bens às suas posses. Mais complicado é o problema dos custos psíquicos de uma troca. Os custos psíquicos incluem tudo o que o ator desiste ao fazer a troca. Isto é igual ao próximo melhor uso que poderia ter feito dos recursos que utilizou. 

Suponha, por exemplo, que Jackson possui cinco vacas e está a considerar vender ou não uma vaca em troca. Ele decide na sua escala de valor que o seguinte é o grau de valor das possíveis utilizações da vaca:

  1. 5.000 bagas oferecidas pela Crusoe
  2. 100 barris de peixe oferecido por Smith
  3. 4.000 bagas oferecidas por Jones
  4. Utilidade marginal da vaca em uso direto

Neste caso, as três principais alternativas envolvem o valor cambial da vaca, a quarta o seu valor em uso direto. O Jackson vai fazer o melhor uso do seu recurso fazendo a troca com o Crusoe. As 5.000 bagas de Crusoe serão a sua receita psíquica da troca, enquanto a perda dos 100 barris de peixe constitui o seu custo psíquico. Vimos acima disso que, para que o intercâmbio se realizasse, a utilidade marginal das mercadorias recebidas deve ser maior do que a utilidade marginal das mercadorias cedidas. Vemos agora que, para que qualquer intercâmbio específico ocorra, a utilidade marginal das mercadorias recebidas deve também ser superior à utilidade marginal, que poderia ter sido recebida noutro tipo de troca.

É evidente que Jackson sempre preferirá uma oferta de mais unidades de um tipo de bem a uma oferta de menos unidades do mesmo bem. Por outras palavras, o vendedor sempre preferirá o preço de venda mais alto possível para o seu bem. Jackson preferirá o preço de 5.000 bagas por vaca oferecidas por Crusoe ao preço de 4.000 bagas por vaca oferecidas por Jones. Pode opor-se que isso pode nem sempre ser verdade e pode ser compensado por outros fatores. Assim, a perspetiva de 4.000 bagas de Jones pode ser avaliada acima da perspetiva de 5.000 bagas de Crusoe, se: 

  • (a) a desutilidade psíquica do trabalho e do tempo, etc., para entrega a uma distância mais longa a esta última torna a perspetiva de venda à Crusoe menos atraente, apesar da quantidade mais elevada das bagas; ou 
  • (b) sentimentos especiais de amizade por Crusoe ou ódio por Jones servem para mudar a escala de valor de Jackson. Mas a regra de que o ator vai preferir o preço mais alto para o seu bem em termos do outro bem vai prevalecer normalmente. Há que reiterar que um bem não se define pelas suas características físicas, mas pela equivalência de serviço das suas unidades ao ator. Para que um "preço" seja comparável com o outro, o bem deve ser o mesmo. Assim, se Jackson prefere vender a sua vaca por 4.000 bagas de Jones em comparação com 5.000 bagas de Crusoe, não significa que ele escolha um preço mais baixo para o seu produto em termos do mesmo bem (bagas), mas que ele escolhe um preço em termos de um bem (bagas de Jones) sobre um preço em termos de um bem totalmente diferente (bagas de Crusoe). Da mesma forma, se, devido a sentimentos de amizade ou hostilidade, receber bagas de Crusoe assume uma qualidade diferente da de receber bagas de Jones, os dois pacotes de bagas já não são de igual serviço para Jackson, e, portanto, tornam-se para ele dois bens diferentes. Se estes sentimentos o fazem vender ao Jones por 4.000 bagas em vez de Crusoe por 5.000 bagas, isso não significa que ele escolha um preço mais baixo para o mesmo bem; ele escolhe entre dois bens diferentes - bagas de Crusoe e bagas de Jones. Assim, a todo o momento, um ator venderá o seu produto ao mais alto preço possível em termos do bem recebido.

Claramente, o inverso é verdadeiro para o comprador. O comprador sempre comprará o seu bem ao menor preço possível. Esta verdade pode ser traçada no exemplo que acaba de ser discutido, uma vez que, no momento em que Jackson era um vendedor da vaca, ele também era um comprador das bagas. Onde o bem em questão - bagas - era comparável, ele comprou ao menor preço possível - dizem 1/5.000 vacas por baga em preferência 1/4.000 vacas por baga. Nos casos em que Jackson escolhe o último preço, as duas bagas já não são as mesmas, mas diferentes bens. Se, para comprar bagas, o comprador tem de ir mais longe ou comprar a alguém de quem não gosta, então este bem torna-se num outro bem da mesma espécie mas com outro valor por ser comprado a um amigo.

  • 21.Cf. Mises, Ação Humana,pp. 204-06; e Menger, Princípios da Economia,pp. 192-94, 305-06.

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